- Em 2023 estima-se que o volume de transações de investimento em imobiliário de rendimento se situe nos €1.730 milhões, uma quebra homóloga expressiva de 42% face ao ano anterior e que teve particular expressão no segundo semestre.
- Verificou-se um maior interesse dos investidores nos setores de hotelaria e retalho, que agregaram à volta de um terço do volume total investido cada.
- No que respeita à ocupação, o setor de escritórios registou quebras distintas nos volumes de absorção das duas principais cidades do país, nomeadamente uns expressivos 66% na Grande Lisboa mas somente 6% no Grande Porto.
- No setor de retalho o número de aberturas de novas lojas esteve em linha com o ano anterior, com as cidades de Lisboa e Porto a observarem crescimentos homólogos de dois dígitos.
- A atividade ocupacional do mercado de industrial & logística estabilizou, com o aumento homólogo de 7% nos três primeiros trimestres de 2023 a compensar a expetável quebra no último trimestre do ano.
- O setor de hotelaria registou o maior crescimento, com um aumento transversal de todos os indicadores, inclusive para valores acima dos registados em 2019.
A Cushman & Wakefield (C&W) divulga o resumo da atividade do mercado imobiliário nacional em 2023 e as suas perspetivas para 2024.
Segundo Eric van Leuven, diretor-geral da consultora em Portugal, “O ano de 2023 foi desafiante, num enquadramento de subidas das taxas de juro por forma a controlar o aumento da inflação e de aumento dos custos de financiamento, com consequente impacto no mercado imobiliário global. Em Portugal registou-se um abrandamento da atividade de investimento imobiliário comercial e, no mercado ocupacional, o setor de escritórios na Grande Lisboa atingiu inclusive o segundo valor mais baixo de absorção da última década. Não obstante, outros setores demonstraram maior resiliência, mantendo a tendência de retoma moderada, como retalho e industrial & logística. O setor de hotelaria teve a melhor performance, atingindo inclusive valores homólogos acima dos registados em 2019 (pré-pandemia).”
Mercado de investimento imobiliário comercial
A atividade de investimento imobiliário comercial[1] registou um abrandamento ao longo de 2023, com as previsões de fecho de ano a situarem-se atualmente nos €1.730 milhões, representando uma quebra homóloga expressiva de 42% face ao ano anterior, ainda assim em linha com outros mercados europeus. Dada a menor disponibilidade do capital estrangeiro, os investidores domésticos aumentaram a sua quota de mercado para 31% do volume total investido.
A alocação de capital por setor demonstrou o maior interesse dos investidores nos setores de hotelaria e retalho, que agregaram respetivamente 42% e 35% do volume total investido. Na hotelaria, o total de €730 milhões foi particularmente influenciado pela compra pela Arrow do portfólio Dom Pedro à Saviotti por €250 milhões. No retalho, entre um total de €600 milhões investidos, as duas maiores transações corresponderam à aquisição pela LCN Capital Partners à TREI do projeto Amália (um portfólio de 50 supermercados Pingo Doce e Continente) por €140-150 milhões e à compra pelo First Retail Partners, um novo fundo da Partners Group a ser gerido pela Mitiska REIM, de um portfólio de 5 retail parks por um montante a rondar os €100 milhões.
Por seu lado, o setor de escritórios atraiu somente 9% do valor investido, com €160 milhões, tendo-se destacado a aquisição pelo BNP Paribas REIM do edifício Pier III à Períptero por €30-35 milhões.
Seguiram-se os chamados ativos alternativos, responsáveis por 9% do total investido, onde se inclui a compra pela Live Nation da Ritmos & Blues, incluindo o espaço de eventos Altice Arena, por um valor na ordem dos €50 milhões. Finalmente, o mercado de industrial e logística representou somente 4% do valor investido, com predomínio da aquisição pela Corum Asset Management ao Grupo Vila Nova do edifício Logifam em Vila Nova de Famalicão por €26-28 milhões.
No contexto atual, as taxas de rentabilidade refletiram a exigência de maior retorno por parte dos investidores, com aumentos transversais nos principais setores do mercado imobiliário comercial face a 2022, nomeadamente entre os 25 e 75 pontos base. Desta forma, no final de 2023 as yields prime corrigiram em alta para os 5,00% em escritórios, 4,75% no comércio de rua, 6,50% em centros comerciais e 5,75% em logística.
Relativamente à atividade de promoção e reabilitação urbana , estima-se que em 2023 se tenha registado uma diminuição de 54% face ao ano anterior, com um volume alocado a este tipo de operações na ordem dos €390 milhões. Entre as operações de maior dimensão, destacam-se a compra da Quinta do Morgadinho (Loulé) pela Bondstone à Interfundos por um valor acima dos €50 milhões e a aquisição pelo Grupo M Caetano à EDP de um terreno na Rua do (Porto) por um valor estimado em €45 milhões.
[1] Definido como investimento em produto imobiliário comercial acabado e de rendimento.
Mercados ocupacionais
Escritórios
Entre as principais transações do ano incluem-se no Parque das Nações (zona 5) o arrendamento pela Emma – The Sleep Company de 4.600 m² no edifício Lumnia do Exeo Office Campus e pela Intelcia de 3.860 m² no edifício Espace e, nas Novas Zonas de Escritórios (zona 3) a ocupação pelo Hospital da Luz dos 4.130 m² da Torre H nas Torres de Lisboa – as quais contribuíram para que estas duas zonas tenham cada uma agregado cerca de um quarto da procura total.
A taxa de desocupação registou nova correção em alta para os 7,6% e foram concluídos 36.000 m², dos quais apenas 20% se encontram ainda disponíveis para arrendamento. O volume de oferta futura mantém-se elevado, com 269.000 m² de escritórios em construção, mas 45% já tem ocupação assegurada.
Por seu lado, o mercado do Grande Porto demonstrou uma maior resiliência, tendo registado até novembro uma ligeira quebra homóloga ligeira da absorção de 6%, num volume total de 49.500 m². O maior negócio correspondeu à ocupação integral dos 7.820 m² do Boavista Office Center (BOC) pelo operador nacional de flex offices LACS, o qual contribuiu para que o CBD Boavista (Zona 1) tenha sido a zona mais ativa, agregando um terço da ocupação. Seguiram-se dois pré-arrendamentos por entidades confidenciais, nomeadamente de 5.650 m² no projeto ICON Offices e de 4.300 m² no Lionesa Business Hub.
Nesta região, a taxa de desocupação aumentou para os 8,5%, tendo sido concluídos 37.300 m², dos quais 42% ainda se encontram por ocupar. Relativamente à oferta futura, 90.200 m² encontram-se em construção, com 30% dessa área com ocupação já garantida.
Relativamente aos valores de mercado, a reduzida disponibilidade entre os edifícios com melhor qualidade contribuiu para um novo aumento da renda prime no Prime CBD (zona 1) da Grande Lisboa para os €27/m2/mês e no CBD Boavista (Zona 1) do Grande Porto para os €19/m²/mês.
1 Aquisições de edifícios para reabilitação ou terrenos para promoção.
2 Informação agregada pela Cushman & Wakefield baseada em fontes internas e públicas.
Retalho
Ao nível da oferta de conjuntos comerciais, apesar de em 2023 ter sido somente concluído o Salinas Park (Vila Franca de Xira) com 12.000 m² de ABL, até 2026 prevê-se a conclusão de mais 81.500 m² de ABL, 65% dos quais em formato retail park e aos quais acrescem a expansão do Centro Colombo (Lisboa) e a abertura do City Center Covilhã.
Em termos de rendas de mercado, a escassez de oferta nas principais zonas de comércio de rua contribuiu para um aumento dos valores praticados, nomeadamente em €2,5/m²/mês no Chiado (Lisboa), para €125/m²/mês, e na Baixa (Porto), para €77,5/m²/mês. Nos centros comerciais as rendas prime aumentaram €5/m²/mês, para os €107,5/m²/mês, verificando-se um ligeiro incremento dos valores brutos nos retail parks, para os €12,25/m²/mês.
Industrial & Logística
Face a este enquadramento, registou-se um incremento generalizado dos valores prime de mercado, excetuando nas zonas 1 da Grande Lisboa (Alverca - Azambuja) e do Grande Porto (Maia - Via Norte) que se mantiveram estáveis nos 5,00€/m²/mês.
3 Amostra não aleatória da procura de retalho agregada pela Cushman & Wakefield baseada em fontes públicas e trabalho de campo direcionado.
Hotelaria
O ano de 2023 consolidou a recuperação da atividade turística em Portugal face ao ano anterior, verificando-se um aumento transversal de todos os indicadores, inclusive para valores acima dos registados em 2019. Entre janeiro e novembro o número de hóspedes e dormidas tiveram aumentos homólogos de 13% e 10%, respetivamente. Ao nível dos indicadores de operação hoteleira, os proveitos totais ficaram 20% acima do período homólogo, com o RevPAR (Revenue per Available Room) a ter um crescimento de 18%, para os €77,3.
Em termos de oferta hoteleira, durante 2023 foram inauguradas acima de 50 novas unidades, com 3.300 quartos, mais de metade dos quais com classificação 4 estrelas. Entre as maiores aberturas destacam-se o Moov Lisboa Oriente (2 estrelas) com 180 quartos, o Renaissance Porto Lapa Hotel (4 estrelas) com 160 quartos e o Masa Hotel Campo Grande (4 estrelas) com 150 quartos.
Quanto à oferta futura, encontram-se em fase de projeto e/ou construção mais de 100 novos projetos hoteleiros, que totalizam 10.200 quartos, com abertura prevista para os próximos 3 anos. Esta oferta futura continua a concentrar-se maioritariamente em hotéis de 4 e 5 estrelas (30% e 38% respetivamente) e nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto.
Perspetivas 2024
No que diz respeito a previsões para 2024,
Perspetiva-se que o aumento das taxas de referência dos bancos centrais tenha atingido o seu pico em 2023, iniciando um movimento de contração durante a segunda metade de 2024. Neste enquadramento, Eric van Leuven comenta, “as expetativas apontam para que o impacto no mercado imobiliário comercial nacional se traduza em comportamentos distintos durante este ano, com o primeiro semestre a refletir ainda contração em alguns indicadores, particularmente nos setores mais afetados em 2023, seguido de uma segunda metade do ano com uma retoma gradual generalizada. Desta forma, apesar das yields de referência de mercado poderem ainda sofrer alguma correção em alta durante o início do ano, no final de 2024 deveremos estar a registar uma estabilidade homóloga, possivelmente com redução de yields, e consequente aumento de valor, entre as categorias mais resilientes. Em termos de valores de arrendamento, a escassez de oferta de qualidade deverá continuar a justificar aumentos pontuais das rendas brutas de referência para os melhores ativos”.
Ao nível do investimento imobiliário comercial, as estimativas atuais confirmam esta tendência, nomeadamente com um volume de investimento associado à transações atualmente em diversas fases de negociação, e com conclusão prevista para 2024, na ordem dos €1.800 milhões, o que refletirá um crescimento homólogo acima dos 10%. Em termos de distribuição por classes de ativos, estima-se uma recuperação de escritórios, agregando 46% do volume total, seguido de hotelaria com 30%. A este valor previsto poderão vir ainda acrescer €1.000 milhões em transações atualmente suspensas (mas com possibilidade de conclusão até ao final de ano), assim como as usuais operações off-market.
No mercado ocupacional, o setor de escritórios deverá continuar a ser caracterizado pela adaptação das empresas aos modelos de trabalho híbridos. Esperamos, contudo, que os principais ocupantes comecem a assentar ideias em relação às suas necessidades (quantitativas e qualitativas) de espaço, o que conduzirá a maior dinamismo no mercado de arrendamento – nomeadamente para os ativos mais modernos e nas melhores localizações.
Em retalho, os retalhistas continuarão a investir na oferta de uma experiência de visita diferenciada às suas lojas físicas como forma de fidelizar os clientes. Esperamos um bom desempenho em todos os subsetores: comércio de rua, centros comerciais e out-of-town retail (retail parks, stand alones, supermercados e factory outlets).
Já em industrial & logística, o enfoque dos ocupantes na otimização dos custos de operação deverá continuar a contribuir para que se mantenha a procura de espaços de qualidade, estimulando o desenvolvimento de nova oferta, inclusive através da remodelação de espaços obsoletos. O stock atual é consideravelmente “datado”, e tanto ocupantes como investidores procuram sobretudo imóveis modernos e com credenciais de sustentabilidade. Setores de nicho, como o self-storage e os data centres, continuarão a sua progressão.
Em hotelaria, antecipa-se que o setor continue a crescer durante 2024, suportado pela competitividade do País enquanto destino turístico, particularmente entre os turistas internacionais.
Na área habitualmente designada por living. teremos realidades distintas: o setor residencial para arrendamento teima em não arrancar (sobretudo pelos elevados custos da fiscalidade e pela incerteza regulatória dos últimos anos), mas outros setores como as residências de estudantes e as residências seniores tenderão a crescer em importância.
Impõe-se ainda falar dos chamados ativos alternativos (como hospitais e clínicas, escolas e universidades e imóveis para life sciences), para os quais existe muita procura de investidores, mas cuja oferta no nosso País é ainda muito limitada.
Finalmente, e de forma transversal a todos os setores, destaque total para o maior enfoque de todos os players de mercado na qualidade e sobretudo na sustentabilidade. Nesta matéria, é já evidente a disponibilidade de inquilinos e investidores para pagar um green premium por ativos muito sustentáveis, penalizando todos os outros com o chamado brown discount. Por outro lado, muitos proprietários institucionais que têm exigências ESG muito fortes quanto à composição dos seus portfolios veem-se neste momento a braços com um difícil dilema para alguns edifícios mais obsoletos: a dúvida entre investir fortemente na sua descarbonização (sem garantias de que a valorização acrescida justifique o custo) ou reconverter esses imóveis para outros usos mais adequados às necessidades do imobiliário de hoje.